10.5.06

...

Quando eu era um miudo de seis ou sete anos, o meu avô, que de vez em quando escrevia uns versos, ensinou-me duas quadras para eu aprender o que era uma quadra. Nunca mais as esqueci.

Uma era assim:

Se as coisas que a gente sente
cá dentro, tivessem voz,
muita gente, toda a gente
teria pena de nós.

E a outra:

Saudade, tenho saudade
do tempo em que não sabia
que essa palavra saudade
infelizmente existia.

Tenho a ideia de ele me ter dito que uma delas fora escrita por ele em muito novo. Náo me lembro qual, ou talvez nunca mo tenha dito.

20 Comments:

Blogger aquilária said...

escrita pelo teu avô, deve ter sido a primeira. porque da segunda também me lembro eu, foi um colega de turma que a escreveu num papel e ma meteu dentro dum livro de matemática. e daí, quem sabe, talvez esse meu colega de turma tivesse sido amigo de um teu colega de turma e tivesse sabido da quadra por ele que, por sua vez, tinha sabido dela por ti. ou... :)

...e também tenho uma história (aliás, tenho mais, mas só conto esta) que está relacionada com quadras: um familiar que estava a receber tratamento psiquiátrico e com o qual eu me dava muito bem, andava muito nervoso porque tinha de inventar uma quadra relacionada com os santos populares (acho que esta "tarefa" fazia parte da terapia) e não sabia o que havia de escrever.pois bem, resolvi "meter mãos á obra" com ele e não só inventámos a tal quadra, que era assim:

santo antónio e são joão
com são pedro combinados
entraram na diversão
da roda dos namorados

como a pusemos a num vaso de manjerico que pintámos com corações. ainda me lembro da alegria dele, pelos elogios que no dia seguinte recebeu!

foi muito divertido porque, para além desta, escrevemos outras, qual delas a mais disparatada, que nos faziam rir até ás lágrimas...

10/5/06 12:42  
Blogger aquilária said...

corrijo: em vez de "a pusemos a...",
"pusemos-a"
ahahahahhah

10/5/06 12:44  
Blogger Goldmundo said...

dei-te uma quadra e pusemos-a
no manjerico espetada
aos santos todos lisemos-a
e eles não gostaram nada

:(

11/5/06 21:19  
Blogger aquilária said...

julgaram que foi pecado
entrar em tal reinação
tivessemos-a calado
já não dava confusão

:(

12/5/06 11:19  
Blogger aquilária said...

se esta escrita ateimasse
em dizer o que sentimos
talvez saudade queimasse
nas palavras que mentimos

que é sempre um escrever por fora
do que se inscreve cá dentro
a saudade é uma amora
com uma rosa no centro

com uma rosa no centro
hás-de-la pôr á lapela
que há sempre um esconder pordentro
do que se mostra á janela

:P

12/5/06 11:35  
Anonymous Anónimo said...

Sempre que "linko" e entro
dentro desta grande ribeira
sinto muito cá por dentro
qu'alma se anseia inteira

e é como se acordasse
de uma vida tão dormente
e no fundo mergulhasse
num negro que se quer gente

e a todos (vós)amo tanto
que de todos me evado
entoando um só canto
que parece sempre um fado

maria do mar

12/5/06 12:47  
Blogger Goldmundo said...

Fosse uma amora a saudade
vermelha era a minha boca
por só dizer a verdade
a minha fala é tão pouca

como uma rosa ateimada
como uma amora a queimar
estás longe e calo-me em nada
estás perto e calo-me a olhar

mas por mor disso me queimam
as coisas que te não digo:
hei-de-la pôr à janela
só pr'a te ver ao postigo.

e se te mostrares por dentro
do que te escondes aqui
com uma rosa no centro
meu coração é pr'a ti

(tivessemos-a calado
como calado eu andei
e eu não teria pecado
co'as coisas que confessei)

P.S.

maria do mar, são tantas
as ondas que o mar nos faz;
se é este o fado que (en)cantas
volta sempre, se te apraz:

;)

12/5/06 17:08  
Blogger aquilária said...

nessa ribeira que lavras
como uma amora ateimada
cantam lume rosas bravas
no que falas quase nada

cantam lume rosas bravas
os meus olhos ao postigo
mas são grades as palavras
sempre que falo contigo

teu coração que deitavas
no dentro do meu falar
com sedas o embrulhavas
nao fosse o meu acordar?

(se ainda assim ele se assustasse
tão frágil e delicado
se a tua mão mo guardasse
tu não terias pecado)

:)

goldmundo, foi um prazer, este (entre)cruzar de quadras

13/5/06 17:48  
Blogger aquilária said...

NOTA aos passantes: quando se escreve de improviso e há a preocupaçao de criar rimas, ficam frases que podem ter sentido dúbio.

assim,
"no que dizes quase nada" = "no quase nada que dizes",em ligação com a frase escrita pelo goldmundo:"a minha fala é tão pouca"

é só isto, mas acho importante a explicação, pelo muito que esta escrita me diz.

13/5/06 21:47  
Blogger Goldmundo said...

LINDO !!!

:)

Com sedas e rosas bravas,
lumes cantados baixinho,
no postigo em que me olhavas
meu coração fez o ninho;

palavras são grades grandes
quando ficam por falar;
vivo à espera que me mandes
meu coração te entregar.

Mas se esse dia demoras
hei-de-lo pôr embrulhado
na saudade das amoras
e mandá-lo ao teu cuidado:

com uma rosa no centro,
dos seus espinhos picado,
para que o vejas por dentro,
lhe conheças o pecado.

E se o não quiseres manter,
antes de deitá-lo fora,
dá-lhe, coitado, a beber
do sumo fresco da amora.

14/5/06 17:15  
Blogger aquilária said...

neste sol-pôr eu envio
recado que diz assim:
larga o ninho sê navio
coração vem até mim

mas na hora da partida
não te esqueças de deixar
em negra capa escondida
rosa de prata a brilhar

e sem ninguém suspeitar
e sem ninguém dar por ela
abraça o meu coração
que por ti espera á janela

á janela da saudade
que os nossos olhos não negam
falam agora verdade
dois corações que se entregam

trazem espinhos cravados
na sede das suas mágoas
passarinhos afogados
no fado das negras águas

em negra capa a voar
numa tristeza de amora
brilhante rosa de prata
cantará por eles agora

14/5/06 23:19  
Blogger Fata Morgana said...

Olha, venho estragar o ambiente com as minhas sombras, que hoje se agarraram à primeira quadra do teu avô e quem me dera tê-la eu escrito!
Hoje só vejo as rosas se lhes apertar com força os pés... Sinto-as, dói.

:(

15/5/06 01:27  
Blogger Goldmundo said...

Morgana, as sombras nunca estragam, sabes disso. Estou contigo nas rosas.

15/5/06 18:06  
Anonymous Anónimo said...

e quando um ao outro se entregam
os corações purificam
num abraçar de almas errantes
que até o negro glorificam

porque o negro é também a cor
que vem do interior da amora
sumo fresco já bebido
que não se vislumbra agora

e tudo o que agora me resta
é a saudade a transbordar
das tuas palavras caladas
silêncio de agrilhoar

e este amor que é secreto
cantado nos murmúrios de um fado
deixa-me o sabor da amora negra
colhida em dia claro...

maria do mar

15/5/06 18:31  
Blogger caminante said...

Magnífico desafío, tierno, sugerente, profundo.
Versos que sólo pueden escribir dos almas en las que anida un profundo sentimiento que surge del corazón. Versos escritos de corazón a corazón, agua limpia, expresión de una inmensa riqueza interior.
Felicidades a los dos. Espero que en este desafío no haya vencedores ni vencidos. Ambos vencen.
Un fortísimo abrazo.

15/5/06 20:47  
Blogger aquilária said...

...isto foi uma dança, caminante, por dentro e por fora do brincar das palavras.

15/5/06 21:28  
Blogger Lord of Erewhon said...

Grande avô!;)

P. S. Escuta lá, ó gótico... ainda te lembras de como se dá ao gatilho, monta/desmonta e carrega a «menina»?:)=

15/5/06 21:48  
Anonymous Anónimo said...

E queria eu também
um coração entregue ao meu
fazê-lo sentir-se tão bem
levá-lo a tocar o céu

(gosto destas)

Parabéns aos dois

15/5/06 23:45  
Blogger Goldmundo said...

:)

dança, sim. obrigado, caminante e malu.

lorde, se entendo a questão, a verdade é que nunca cheguei a aprender completamente. Nunca fui fadado para os trabalhos manuais. Mas foram uns tempos patuscos. :)

Maria do Mar: ...

16/5/06 03:16  
Anonymous Anónimo said...

Super color scheme, I like it! Good job. Go on.
»

23/5/06 23:18  

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