Smoke on the water diz a canção mas devia ser antes trees on the water. Talvez um dia as águas baixem, talvez esta noite os troncos cedam. Agora é isto o que somos, por agora é isto o que podemos ser: nas águas baças do mundo as árvores ficam, nelas a memória e o canto da floresta viva. Nelas ainda a altiva sombra do gamo e a do pastor. Nas águas imensas a flauta simples do pastor.
Trees on the water. Sim, que sei eu da terra que não seja o torvelinho insubstancial dos rios, que sei eu da pedra e do chão e da realidade última dos mundos? Se olhar para baixo vejo só o adensar da cheia, a ameaça invernal da cheia. As águas. Se olhar para cima vejo só o céu, as águas do céu. Mas não sou a terra nem o céu, não sou a dissolução nem a transcendência. Não sou ainda a morte que nunca morri.
Sobre a mudez das águas cantam árvores. Sob a nudez terrível do céu as árvores sabem.