28.5.04

Joana Dark

Se eu soubesse escrever escreveria a história de Joana Dark. A minha Joana Dark seria parecida com a Donzela de França, parecida com cada rapariga a quem a vida deu o frágil por dentro e a morte deu a noite por fora. E a Joana Dark seria o meu amor mais inteiro.

Eu sei da Joana Dark há muito tempo, mas lembrei-me agora dela porque à volta da minha Ribeira voltei a encontrar sítios feitos de tristezas mais fundas. E todos os que acham que os homens e as mulheres são iguais reparem com atenção em como são diferentes as palavras da tristeza (os risos, esses, assemelham-se).

A Joana Dark só se mostra de vez em quando. Quase sempre escreve e quase sempre tem amigos, e quando tem um blog pinta-o com palavras de vermelho e negro. E é preciso lê-la devagarinho, se a lermos, e olhá-la ainda mais devagarinho, se tivermos a sorte de a saber olhar. Porque ela pensa nas coisas como se pensar fosse o nevoeiro da manhã, mas sente as coisas como se sentir fosse a madrugada mais livre. Mas é raro haver palavras que trespassem a sua armadura de noite, e é raro que o primeiro gesto chegue a tempo. Agora já se não deixa abraçar. Quase sempre gosta de animais e quase sempre há um animal que (já) não gosta dela.

Talvez haja um momento na nossa vida em que somos a Joana Dark sem dar por isso, e um outro momento na nossa vida em que a Joana Dark nos gritou e nem demos por ela. E por tudo isso era muito difícil escrever a sua história.

Mas pensando bem talvez não valha a pena escrevê-la. Valia a pena era olhar à volta e não desviar o olhar até que o mundo seja o lugar do início. Valia a pena era seguir as armas da Joana Dark até à vitória ou à derrota, e alistarmo-nos na companhia dos lobos. Valia a pena sermos nós, almas errantes.