"Era uma vez", diziam-me as coisas quando era pequeno demais para as entender.
Era uma vez, sabes, era uma vez uma coisa que não sabes ainda, uma coisa que um dia há-de ser. Era uma vez uma árvore, era uma vez a lua, era uma vez uma menina que um dia foi passear no jardim, as rosas. Era uma vez quer dizer que há caminhos por todo o lado, que há histórias em todos os gestos, que há palavras que nasceram noutro lugar tão longe. Quer dizer que agora era uma vez um menino que lia uma história, um menino à janela a chuva.
Sempre gostei de histórias-crianças e sempre gostei de desenhos assim, como este. Gostava de entrar ali, espreitar só um bocadinho, parar só um bocadinho, entrar naquela lua como se entrasse nas margens do rio. Sempre gostei de gostar.
Veio depois o tempo do mundo, claro, o tempo de fazer coisas e de ver coisas que não são feitas e coisas que se desfazem como se já não houvesse vez nenhuma mais. veio o tempo de ser maior.
E agora é Maio lá fora e por dentro anda o Outono a chegar. Tempo dourado das vindimas. Tempo de deixar o mundo ser como é, de me deixar a mim ser como sou (tão pouco). Os livros já vão a meio, talvez as histórias cheguem ao fim. Ficarão para outros as luas tão grandes. Para outros era uma vez.
Era uma vez o tempo em que o tempo chegou.
[ilustração de Ivan Bilibin, um artista russo
de há cem anos atrás. Se puderem, vejam a beleza que as mãos
dele deixaram]
5 Comments:
"era" sempre uma vez... várias vezes que "eram" uma só vez...
abracinho gold.
Do "era" para o "é"?... Abraço, e bom fim-de-semana, maister Gold
Lindo texto Goldmund!
Também me senti por aquelas paragens sem tempo...
Um beijinho,
Outono da alma... já?
Os buracos góticos só te fazem mal! :)=
Abraço.
sophia, pois...
vitor, abraço também.
dad: enquanto houver desenhos assim as paragens são paragens fáceis :)
oh Klatuu. Eu acho que eu é que faço mal aos buracos góticos. Andam que nem os reconheço :P
Abraço
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