Estes dias tenho andado assim. Não sei como vou atravessar este Verão de cores enganadas. Não estou sequer triste. Morrem-me pedaços todos os dias como a outros lhes cai alegremente a pele do primeiro sol. Eu, que posso passar um dia inteiro no Algarve sem cremes, preciso de um protector para a alma, factor 60. Até a noite cheira como uma multidão. Adormeçam-me até Setembro. Levem-me à Islândia ou à Noruega. Contem-me histórias de reis e de fadas, de vampiros e de amor verdadeiro. Calem-se. Eu não suporto as cores do barulho.
Dava tudo por um silêncio, por uma respiração da terra, por um recolhimento que o Verão não sabe ter. Há demasiada cor, demasiada luz, demasiada planície, demasiada alegria para os meus olhos cansados. E eu bem sei que tudo isto tem, talvez, outra leitura. De anos de inconsciente estudo e de anos em que dei aulas ficou-me guardada a ideia de que o Ano acaba em Julho. É, portanto, tempo de balanço, de medida, de colheita. É o tempo da consciência de si (o signo de Leão) e da colheita e arrumação do mundo (o signo de Virgem). Signos que no meu mapa astral nunca andarão de bem comigo... Em cada Verão me apercebo melhor de que a minha vida nunca foi mais que poeira no vento quente. Por isso preciso do Outono, em que posso voltar a ser as folhas mortas, preciso do Outubro, em que posso voltar a ser a neblina fria. E Outubro é um tempo que sabe a cerveja preta...
Sim, dava tudo pelo silêncio. Dava tudo por um abraço que me calasse de vez.
[quadro: Andrew Vicari, Blue (1970)]
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