Por isso gosto de palavras, quando as palavras são crianças que temos de compreender para que se portem bem junto de nós. E para que possamos ser, finalmente, crianças no meio delas. (meto-me aqui na conversa de baixo, sobre silêncios e pássaros e coisas erradas)
E é com certeza, António, a inspiração e a paciência andam sempre de mãos dadas. Obrigado pela resposta. Vamos então ver o que acontece. Sim, estou a ver mesmo tudo ao mesmo tempo, nina e ebola, como pássaros...
"Gosto de algumas palavras, como ilhas num mar de silêncio. Gosto de alguns gestos leves, como pássaros num quadro, no acto de migrar, num voo errante que o olhar do pintor faz quase parado...". Sim. É isso o que eu quero dizer, ou é por isso (para poder dizer coisas assim) que preciso de encontrar a contrapartida de "silêncio". Mas há mais, não há?
Numa bica de água. Também é verdade que os pássaros não farão o voo errante se não houver a bica de água. Mas...
"Gosto de algumas palavras, como ilhas num mar de silêncio. Gosto de alguns gestos leves, como pássaros num céu ausente". João, isso vai-nos levar longe, muito longe. Como pássaros no acto de migrar. Já vamos ver.
Quietude. Carla. E fico a pensar se a quietude vem do céu ausente. (se deus existisse..., como dizes em Elsinore).
Estive a reler o "Tão longe de sítio nenhum". (leiam se puderem, se não conhecem, leiam.) E por isso e por coisas que aqui na ribeira se disseram e se calaram (é bom a minha ribeira não ser às vezes só minha), queria falar de coisas quase caladas, quase a parar.
Repara. Eu posso dizer assim: "com ela as palavras não eram precisas. às vezes estavamos ali uma tarde inteira, e era o silêncio que nos unia e era o silêncio calmo que nos contava tudo um do outro.". E depois quero continuar, como continuava o personagem do "Tão longe...": "sabíamos que gostávamos um do outro, mas não era preciso abraçar, não era preciso gesto nenhum. Porque era a "...." que nos unia, era o "....." que nos fazia tão perto."
Não, não creio que seja a bica de água. É qualquer coisa de azul. É que o silêncio tanto pode ser uma coisa à nossa volta, "à minha volta, o silêncio do céu, o silêncio do deserto. Ah deus, porque não respondes?" como pode ser uma palavra especial minha ou tua, como o joker do baralho de cartas: "e o silêncio dela disse tudo o que ele queria saber, e ele sorriu".
Por isso o silêncio é tão simples e tão estranho.
Mas os gestos são palavras a dançar nas pontas dos dedos, não é? E o silêncio na ponta dos dedos, o silêncio que faz afagar os teus cabelos num gesto quase parado (numa quietude?), o gesto que não é acto de poder mas apenas acto de amor e por isso diz tudo sem fazer nada? ( e vem daí o céu ausente?! )
(ele adivinhou o gesto que ia no coração dela. e soube tudo o que queria saber. e ela fez-se inteira nos olhos dele, como pássaros soltos num céu ausente. e nas mãos dele quase paradas bailava indeciso o sorriso terno da manhã.)
12.8.04
Qualquer coisa de errado, qualquer coisa de azul
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