2.11.05

Somos barcos. Somos, impossivelmente, barcos. Sempre pequenos, tão frágeis. Barcos lançados sem saber por quem, no alto mar de que não sabemos nada. Às vezes - andei desde quinta feira no meio de gente assim - cruzamos no mar os navios orgulhosos, os couraçados revestidos a metal, as velas arrogantes: aqueles que julgam que a noite os temerá, gente tão forte. Ah... mas lá de dentro, tão lá de dentro dos porões da vida calada, tento escutar o soluço baixo dos marinheiros jovens. A que naufrágio terrível, a que inútil vitória os arrastam os comandantes cegos? Estive no meio de gente tão diferente do que sou, tão difícil ver por trás das paredes cerradas. A vida é assim.
Somos barcos, sabes? Todos somos barcos de além-andar. Desde quinta feira trabalhei sempre (estranho Halloween tive, noite sombria). Pensei também: pensei que o amor aos homens não é mais que o amor que nos merecem os prisioneiros. Pensei que é fácil amar alguns, os barcos pequenos e abertos, os barcos à deriva feitos do medo e da aventura da vida. E pensei depois que perdoar não é esquecer uma ofensa, mas ver no barco de guerra os olhos prisioneiros, e não o navio inimigo.

9 Comments:

Anonymous Anónimo said...

é bonito quando falas de navios e do mar!! (gostas de mar?)

um dia... passeava eu pelos links que por aqui tens e descobri uma conversa tua com a "eu mesma"... acerca do navio, da "aliança inteira"... (falavas do casamento...)

Achei tão sábias as tuas palavras que as ofereci (e desculpa se o fiz sem te pedir autorização) a um casal amigo meu que se ia casar...

... falava de navios... dos mastros que presos ao leme dão um rumo a estes barcos frágeis...

és um barco muito bonito!
tenho descoberto muita coisa a navegar nesta ribeira clara... muito clara...

3/11/05 09:55  
Blogger aquilária said...

excelente texto, goldmundo. e mais uma vez tenho de concordar contigo: navios habitados por um imenso mar, fúrias e tempestades. cá dentro, também, países tranquilos, apenas entrevistos na neblina.é isso que somos. é terrível e magnífico.
um abraço

3/11/05 12:16  
Anonymous Anónimo said...

oh aquilária, que bom que estás por aqui!!há muito que não escreves! O "Lost" está bom?

Beijinhos

3/11/05 14:25  
Anonymous Anónimo said...

Sim, "a que naufrágio terrível, a que inútil vitória os arrastaram os comandantes cegos"!
Amar estes, sobretudo, para que consigamos desviar-lhes o olhar da lama e, mesmo por detrás das grades, eles possam ver as estrelas

3/11/05 17:35  
Anonymous Anónimo said...

isto num joga lá muito a bote com a perdigote. Barcos frágeis e depois Couraçados???

Eu cá por mim sou um petroleiro, mas gostava de ser uma canoa do taiti arraçada de porta-aviões.

4/11/05 09:14  
Blogger Vítor Mácula said...

Caro Goldmundo.

Todos crianças perdidas, claro, e no escuro acendendo fósforos que apenas alumiam intermitentemente o redor imediato, claro.

Um abraço, e bom fim de semana.

4/11/05 16:53  
Blogger Roberto Iza Valdés said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

4/11/05 22:29  
Anonymous Anónimo said...

"...tento escutar o soluço baixo dos marinheiros jovens."

Mas porque raio é que os marinheiros jovens estão a soluçar baixinho? cheira a pederasta nesse navio de comandantes cegos...

8/11/05 12:01  
Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido pelo autor.

31/8/07 21:49  

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