- Marinheiro do mar morto,
porque andas a navegar?
- Nasci num barco sem porto,
quero só morrer no mar.
- Marinheiro do mar alto,
fazes-me falta no mar...
- Já não sou eu que te falto,
falta-te só embarcar.
- Marinheiro do mar fundo,
ensina-me a ser assim...
- Quando a morte for teu mundo
é que hás-de chegar a mim.
Casimiro Ceivães (1912-1931)
Hei-de uma noite contar esta história, e nessa noite só comigo hei-de eu contar.
Era uma vez um mundo que apagava os homens, e era como se as coisas não fossem senão cinza e pó. E era uma vez o homem que acendia os mortos, e nem aos anjos coube tarefa igual: na noite acesa os mortos dançam, tão branca a sua dança de luz.
(Criatura é o meu nome, cantou a estrela polar)
Sim, nessa noite hei-de ser o vermelho e o roxo, hei-de ser a voz calma e o gesto inteiro: contar esta história só se pode assim. E nessa noite a noite hei-de ser.
A morte, segredo dos mundos. "Era uma vez uma história em que eu tinha morrido", alguma vez dançaste num mundo assim? Alguma vez paraste a ouvir? E na verdade a morte é a coisa mais simples; mas para que voar seja simples faz-te, antes, falcão.
E, sabes, eu não acredito nas histórias tristes. Tristes são só os olhos que as temem.
(Terror é o meu nome, gritaram os anjos velhos)
Sim, uma noite hei-de contar esta história, a minha história com princípio e fim.
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