Meu senhor tão sério, de fato e gravata,
venha olhar a lua feita toda em prata...
Venha olhar a noite feita de mistério,
meu senhor tão velho, meu senhor tão sério...
Guarde essa gravata de seda azulada,
feche-a num armário, deixe-a bem fechada...
Nem bengala de oiro nem botões de punho,
não precisa deles na noite de Junho...
Ainda vai a tempo, meu senhor sozinho,
saia à rua agora, deite-se a caminho...
A camisa branca, tão bem engomada,
troque-a pelo negro, não lhe custa nada...
E o par de sapatos ontem engraxado...
(Meu senhor, condiz com o caminho errado!)
Umas calças pretas, umas botas duras...
saia à rua agora, está tudo às escuras...
Venha até ao bairro de casas tão velhas,
troque o telemóvel por rosas vermelhas...
E na porta estreita com uma luz azul,
meninas de negro, meninas de tule...
Meu senhor calado, meu senhor tão só,
dance com fantasmas vestidos de pó...
Dance toda a noite, beba mais e mais,
brinde aos sonhos tristes, brinde aos seus iguais...
Que é feito do rosto que já foi o seu,
meu senhor tão novo de olhos cor de breu?
Que é feito das mãos que já foram as suas,
meu senhor tão simples de olhos como luas?
Que é feito das asas que um dia quis ter?
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(meu senhor vampiro, vai amanhecer...)
Vamos para casa, vai nascer o dia,
meu senhor tão velho, de alma tão vazia...
(- Diz-me, meu amigo, naquela janela...
um vulto tão lindo, poderá ser ela?...
Ai o fim da noite, tão igual a mim...
Diz-me, meu amigo, porque sou assim?...)