30.9.04

Não



Não entendo os que não vêem o mundo - cada instante do mundo - como um combate total. Menos ainda os que tentam que o combate seja uma tarefa para os outros.

Não entendo os que mudam de sentir conforme sopram ventos de vitória ou de derrota. A primeira lição da espada é ser igual.

Não entendo os que se julgam guerreiros só porque desconhecem a misericórdia. Se forem genuínos, são os verdadeiros solitários. Mas nesse caso, também não conhecem o desprezo, esse sentimento dos fracos. A força verdadeira é indiferente.

29.9.04

Sonho



Acordados vêm os mortos
buscar o homem que dorme
na casa grande demais

Andam curvados estão mortos
e o homem da casa enorme
não dormirá nunca mais

São brancos da cor das velas
e nos vidros das janelas
sombras mortas vêm bater

São brancos vêm acordados
a casa cai aos bocados
que o homem vai-lhe morrer.

Mortos curvados na morte
e a casa que foi tão forte
morre com o homem também

riem-se os mortos dançando
e a lua passa cantando
não dorme agora ninguém.




26.9.04

Coisas pequenas

1. Gosto tanto de dançar, tão raro. Eu sou tão devagar. O mesmo para entrar no mar, nunca aprendi a correr e a atirar-me, primeiro fico quieto ao pé da espuma e da areia molhada. Como se falasse, como se me andasse a enamorar. Apanho uma pedra (ainda tenho uma comigo, em forma de coração negro, um dia talvez saiba como a mostrar aqui), espero pela sombra que fazem as gaivotas, deixo as pessoas ir embora. Só depois vem a água de uma onda pequenina, depois a de uma outra um pouco maior. E fico pronto quando o mar me sorri. O mesmo (reparei ontem) para dançar. Tantas vezes danço só através daqueles que vejo, como se estivesse sentado no cinema, como se tivesse deixado em casa o corpo e trouxesse só os olhos à noite maior. Tento abraçar uma música e dividem-se em mim as palavras e o ritmo, e se forem mais fortes as palavras fico quieto. Às vezes (tão raro) reconheço-a, sei que já a ouvi (desconfio que quando conheço e não sei quem canta, é The Cure). E às vezes esqueço-me de pensar, de olhar, de estar quieto. Gosto tanto de dançar. (Há muitos anos conheci uma rapariga com quem dançar era simples. Talvez a dança seja igual ao mar).

2. A noite é tão pequenina.

3. Na cidade grande fazem-me falta as estrelas. A profundidade do céu permite que as almas se ergam. Na cidade andamos curvados, olhos sempre pousados (e por isso tantas vezes pousados em alguém, num outro, em nós).

4. É cada vez mais raro ler coisas que tenham sido escritas depois de eu nascer. Leio jornais por vício, como se fossem um cigarro mais. Leio alguns blogs. Leio a Ana Teresa Pereira, alguns poemas, "tales of mistery and imagination". Leio os X-Men. Mas livros livros cada vez menos. A literatura é hoje uma autópsia cada vez mais perfeita a um cadáver que não me interessa. Só a música ainda vive. Os cadáveres deixo-os aos cães.

5. Comprei há dias na Feira da Ladra (paguei dois euros) um livro francês impresso em 1788. É mais antigo que a Revolução Francesa. Às vezes imagino alguém a folheá-lo, em Paris, numa sala escura com velas. Entra devagar uma mulher embrulhada num xaile: votaram a morte do Rei, diz ela, e eu gostava de lhe poder ver as mãos tãos claras. O homem pousa o livro em cima da mesa e vai até à janela, gritos ao longe, a sombra de um palácio, talvez um cão magro em baixo. Ninguém volta a lê-lo até mim. Quando eu o fechar, o livro esperará outros duzentos anos como quem espera o regresso da amada. Que é feito desse homem, que é feito de mim?

6. A Ribeira começou há seis meses, tantas coisas. Eu comecei um bocadinho antes.


Coisas de uma língua antiga

Seigneur, j'ai trop aimé les livres et j'en meurs:
Il eût été plus doux de chercher votre droite;
Si la route qui mène à Vous demeure étroite,
Votre Ombre sans contours y suit le voyageur.

Sur mon chemin que de reflets, que de rumeurs!
Que de miroirs brisés dont chaque éclat miroite!
L'âme des livres morts évente mon front moite
Comme un silencieux oiseau que me fait peur!

Je sais jusqu'où l'orgueil, le savoir, la luxure
Ont entraîné ceux-là, dont l'âme n'est pas sûre...
Le néant qu'ils ont vu, je l'entrevois ce soir.

Les livres m'ont fait mal, Seigneur, mais votre flamme
Peut toujours, corrodant et torturant mon âme,
Combattre par l'amour le poison de savoir!...

Elisabeth Sandy, cerca de 1929 (?)

25.9.04

As mãos vêem, os olhos tocam (II): "The Village", claro.



Construímos torres e muros e sinos de aviso e à noite tanto queremos dormir. Lá fora deixámos a cor má, a cor vermelha das bagas, a cor tremenda daqueles de que não falamos. Mas anda dentro de nós o sangue que é da cor proibida, o branco que quando quer sabe ser a cor mais terrível. "E eu, que não principio nem acabo / nasci do amor que há entre Deus e o Diabo".



Uma porta é sempre um espelho. De tantas coisas não sabemos falar, e não percebemos que elas nos voltam caladas. O silêncio tem duas vozes. E é tão difícil olhar a loucura olhos nos olhos. "Eu não sabia que o mal vermelho andava dentro de ti.". Entra, gémeo negro, diz-me ao que vens. Lucius ("feito de luz"), Lucifer.



As mãos vêem, os olhos tocam. Lá fora anda a criatura do medo e os meus olhos tão simples nunca puderam ver tanta coisa. Os cegos dizem que sou cega, mas sei a cor que ele leva calada consigo. Sei tudo o que há a saber. E não, esta noite não temerei as trevas baças.



The Village. Nós.

As mãos vêem, os olhos tocam. E um filme assim eu não sabia que podia haver. "The village", the bad colour.


Há uma aldeia na clareira dos bosques. Uma aldeia onde entras sem perceber que a porta se fechou devagarinho atrás de ti. Onde vestes um vestido de algodão às flores ou um casaco negro e um chapéu, onde dormes em lençóis que cheiram a lavado, onde as refeições são dar graças pelo tempo que te foi dado. Há uma aldeia na clareira dos bosques, há uma caixa negra fechada em cada casa, há as primeiras árvores que marcam a fronteira dos passos que não vais dar. Há um filme, um filme e há os olhos de espanto de Ivy Walker (fabulosa Bryce Dallas Howard). Porque eu nunca tinha visto um filme assim, uns olhos daqueles. Sim, ela é cega. É cega como nós todos devíamos ser, e vê o mundo todo porque não vê as coisas soltas do mundo e diz a Lucius Hunt (um quase impossível Joaquin Phoenix) "eu vejo a cor que tu trazes, nem todos trazem cores". Há as bagas vermelhas do bosque e o capuchinho desta vez é o capuchinho amarelo, the safe colour. Há um bosque para atravessar, um filme para ver de olhos abertos, tão cegos como cegos são os olhos de Ivy-a-pura.


Vê este filme, ou antes deixa que este filme te veja a ti. Não vás à procura de emoções fortes, não leves pipocas, não vás se te apetecer rir ou beijar ou passar uma noite boa. Vai sozinho, sozinha, como quem vai ao mar à noite, à lua maior, ao inferno das portas fechadas. Não acompanhes a história a pensar, deixa que tudo chegue ao fim e tudo fique tão presente como presentes andavam as flores vermelhas, as bagas vermelhas (the bad colour), como presentes sentiste as criaturas do bosque, those who we don't speak of. E percebe que o bosque todo anda cá dentro.

Há uma aldeia sim (não uma vila, e não vale a pena ter pena dos nossos tradutores) e há a pureza americana de Bryce Dallas Howard. Se puderes tirar os olhos dos olhos dela, vê bem as mãos dela a ver.




Eu não posso contar a história, não posso. Não te posso mostrar as bagas vermelhas, o sangue, e uma faca assim nunca tinha sido filmada, um peso assim. E não é por querer que sejas tu a encontrá-la, é porque não se pode contar uma música, um coração apertado, a mão que se estende para as trevas porque sabe que do meio delas há-de vir a noite assombrosa do amor mais inteiro. Nunca mais se vires isto podes pensar que a noite e as trevas andam de mãos dadas, são iguais. Nunca mais deixas de olhas as folhas douradas de Outono.


As pessoas querem sempre que eu fale, diz Lucius Hunt, quase parado quase a fechar. As pessoas querem que eu fale, e que adiantava dizer que trago tantas coisas cá dentro. Porque a minha mãe guarda a chave da caixa dos segredos.

As pessoas querem falar, e eu não tenho medo porque nunca penso no que me vai acontecer, penso só no que tem de ser feito. Os bosques estão vivos sim, o medo tem máscaras de medo. Mas eu treinei-me a ficar de costas para as árvores vivas, braços abertos, olhos abertos para ver as bagas vermelhas, os olhos tão abertos de Ivy Walker junto ao rochedo-de-falar. E se me obrigas a falar sim dançaremos na noite de núpcias, e um dia aprenderemos a abrir as caixas negras tão fechadas. Que pena que os mais velhos sejam crianças, que pena o filme acabar.

E se me soubeste entender, se sentiste daqui o toque dos sinos-de-aviso, tem cuidado com a cor má. Tem cuidado com as árvores que dançam. Tem cuidado com as mãos abertas à espera do teu coração. Leva as pedras mágicas se quiseres. Mas se puderes atravessa os bosques do engano, e não deixes que os teus olhos se percam como se perderam aqueles olhos todos que só viam as coisas que já sabiam. Procura bem a estrada escondida. Porque o amor é a coisa maior do mundo, diz uma vez o chefe da aldeia. Diante dele, o mundo todo só pode ajoelhar em espanto.

24.9.04

Já disse isto, mas...



Nenhum blog é uma ilha.

[pintura: do meu pintor preferido, Caspar David Friedrich: Viajante contemplando um mar de nuvens]

Aguarela

Acordei agora mesmo, no meio de um dia que não parece um dia. As coisas têm estado tristes comigo, e nos últimos dias tenho sido como as árvores da rua onde trabalho, a quem cortaram os ramos talvez para a pedra se ver melhor. Sou como a net quando não há net. Não sei do server a que chamamos alma. As luzinhas vermelhas estão todas acesas nos mostradores que chegam de mim a mim. Ao longo de anos fiz portas corta-fogo entre partes das minha vida: o trabalho, os outros, hoje, amanhã, eu. Para poder rebentar por fases, como os quadros eléctricos.

E sonhei, como sonho sempre que durmo de dia, e em sonhos as coisas falaram. Eu estava em casa (a casa em que realmente vivo, o que é raro, um dia hei-de contar a história da casa grande onde nasci, dos sonhos que quinze anos depois ainda nela andavam, a casa que era casa e corpo e mãe e túmulo. Um dia hei-de-me contar).

Era a minha casa sim, mas só no princípio, só para começar a mudar. Havia luz, a luz fiel das cinco da tarde, das manhãs de Outubro, a luz pousada das aguarelas. A rua é que era uma daquelas ruas que eu trouxe de Paris, feita de casas antigas com uma alma contente, com lojas quietas e tabuletas de metal verde e talvez um vendedor de maçãs vermelhas, acho que havia um vendedor e se havia maçãs havia crianças e uma rapariga sentada numa porta em frente à minha que eu sabia que era pintora e tinha uma fita no cabelo.

Entra, disse eu, entra se quiseres porque a minha porta fica sempre aberta e eu vou ter coisas para jantar. E pode ser que estejam os meus amigos. Vê lá da tua casa, disse ela, e eu soube que tinha tido há muitos anos problemas de droga, vê lá da casa de mim.

Depois subi as escadas (havia plantas nas escadas, havia flores) e a minha casa era uma casa da forma do mundo entrevisto. Do mundo daqui. Uma sala tinha uma porta que dava para outra sala com uma porta. Havia vidros e coisas que deviam ser jardins de inverno e talvez um deles fosse um lago e tenho a certeza que do alto de umas escadas se via um bocadinho do mar. Era engraçado, e no sonho eu pensei estou na Ribeira. Os meus amigos vieram e cada um trouxe um bocadinho das casas que foi fazendo. Por isso aquele cantinho parece uma tenda marroquina, ali um bocadito do Bairro Alto, e ali o Douro e aqui a cesta da fruta e a mesa com pão fresco. Gosto muito da minha casa enlaçada.

Não sei se estavam lá todos. Não me lembro de ver todos, mas os que não estavam haviam de chegar com qualquer coisas nas mãos. Ao meu lado estava agora uma rapariga que tem um blog que está ali no meu cantinho dos links e achei engraçado ter uma camisa de mangas bordadas a azul e verde, eu vejo-a sempre de negro. Nem sequer vamos conseguir jantar ao mesmo tempo, dizia ela a rir (eu só lhe via as mangas azul-verde, lembrei-me agora que num sonho que contei aqui também não havia o rosto), somos tantos nesta casa dos mundos. Olha aqueles não conheço, mas trouxeram música e têm ar de gostar de cerveja.

Não me lembro se o sonho acabou (nem sei se os sonhos acabam, se alguma vez aparecem letras para sabermos que podemos acordar e ir fumar um cigarro). Havia coisas que esqueci. Sim, nem sequer vamos conseguir jantar ao mesmo tempo. A música da sala ao lado não tem nada a ver com o cantinho de mar ao cimo da escada. Se calhar a chave da porta já se perdeu há muito tempo, mas não faz mal fica aberta. E a rapariga sentada na rua há-de acabar por subir, há-de dizer eu trouxe uma aguarela.


22.9.04

Não é mau existir. Mau é saber que existimos.

18.9.04

Algumas pessoas encontram-se aqui. Algumas pessoas estão aqui perto de mim, ao meu lado, à distância de um link, de uma palavra, de um sonho. Como se vivêssemos no mesmo prédio, encontramo-nos e reconhecemo-nos, antes de seguir para as casas de dentro. Tantas vezes não as vejo, tantas vezes acho que as conheço desde criança. Os vizinhos têm vizinhos, os amigos tâm amigos. Como círculos na água. Aqui ninguém fez o mapa do mundo, não há estradas nem distâncias em quilómetros, vemo-nos às vezes em casa uns dos outros e às vezes deixamos um bilhete pequeno como quem deixa o pão fresco da manhã. Mas o acaso não existe. Que coisa estranha escreve connosco, escreve em nós, quando nos escrevemos aqui? Que vê ela, que nós não vemos? Para que lado faremos, sem saber, o vento norte soprar?

17.9.04

O Outono é devagar, tempo outra vez tempo feito depois do instante esmagado em luz. Tão lentas caem as folhas, os últimos pássaros. No silêncio igual das tardes a luz aprende a calar. Uma árvore, uma cidade: é o tempo doce da cerveja, da prova do vinho, canção dos mundos tão grandes.

No Outono despeço-me da Amada, dos olhos fundos da Amada. E percorro a floresta intocada das coisas. Verdade, tempo, a dança frágil dos imortais na terra humedecida. No Outono sou maior. Lembro-me de ver as árvores tão jovens. Lembro-me de nascer, de ser a pedra de que os sonhos brotaram. Além cantam os bosques, no alto a estrela polar e a Ursa. No Outono o mar, a visão clara do vento. Mastros negros. Som.


"I've known rivers:
I've known rivers ancient as the world and older than the
flow of human blood in human veins.

My soul has grown deep like the rivers."

(Langston Hughes)

I have tried to write Paradise.

Do not move
Let the wind speak
that is paradise.

Let the Gods forgive what I
have made
Let those I love try to forgive
what I have made.


Ezra Pound, The Cantos: CXX

Baleal



No Sábado, a convite da Catarina-dos-Sonhos, eu e alguns outros passámos uma noite calma que terminou na praia do Baleal. Já passou algum tempo. Os que lá estiveram levaram mais coisas que a areia que entrou em bolsos e sapatos. Há outros que podiam ter estado, que deviam ter estado, que estiveram pelo menos na nossa lembranç, dentro de nós. Esteve também a lua rasgada, esteve também o vento maior.

E estive eu, como de costume quase como se não estivesse. Como de costume quase todo por dentro e quase nada por fora. Quase calado, quase feliz. E agora vou tirar de dentro as coisas que me ficaram, até ficar só com a areia, só com o vento, só com a voz. Os que não estiveram talvez não entendam as coisas, vocês que estavam talvez tenham outra ideia. Mas foi assim o Baleal-de-dentro, foi assim a noite-de-fora e a lua rasgada como são rasgados às vezes os sonhos.

Senti outra vez medo quando entrei nesse país do mar escondido, nesse lugar onde o mar parece tão longe até que numa curva da estrada se chega à terra do fim. É assim o Baleal, foi assim há tantos anos a vizinha Atouguia-da-Baleia que conheci perto de uma passagem de ano e perto de uma passagem de vida. Entro ali (da outra vez também foi noite e vento, mas havia chuva parada) e parece-me entrar num país assombrado, país onde o tempo nos puxa como às vezes nos puxa o mar traiçoeiro. Talvez o sol saiba parar as correntes de tempo, os redemoinhos de estar. Talvez nas manhãs de Agosto haja praias com crianças e bolas e risos e gelados. Talvez seja sempre assim, e quem lá costume andar não dê por ela. Mas se a noite chegar tem cuidado se fores ao Baleal, à Atouguia, às terras do fim. O ar é feito de ossos, o vento cheira a tábuas naufragadas. Sim, talvez seja de mim. Mas o mundo está todo assim dentro dos meus olhos (dos meus ossos).

Da outra vez tinha ido levar os meus filhos tão pequenos, devia seguir para o Alentejo até à meia-noite em Serpa e fui-me atrasando e fui-me perdendo e continuo a achar que era só o vento a puxar. A meia-noite nova ano-novo encontrei-a em Torres Vedras (seria Torres Vedras?) junto a um castelo adormecido e um bêbado acenou-me de uma cabine telefónica sentado e gritou-me feliz natal oh patriota e achei que o ano começava tão bem.

Dois dias depois lá estava de regresso, e saí da auto-estrada porque nunca gostei de auto-estradas (e fiquei a saber que tu também não) e comecei-me a perder e a andar às voltas em estradas sem dono como se a Atouguia me não quisesse entregar os filhos, como se o mar tivesse ciúmes dos seus olhos cinzentos dos seus cabelos de sol. Anoiteceu (e anoiteceu de repente, como se o dia tivesse ido embora como tantas vezes eu vou) e andava eu em montanhas e de-certeza estava a Atouguia tão perto, o Baleal, Peniche, não sei, e não chegava e chovia como se já estivesse no fundo daquele mar que de certeza tem ossos e o limpa-pára-brisas avariou (carro negro) e no banco de trás a Francisca que tinha ficado comigo brincava com uma boneca maior que ela e cantava atirei o pau ao gato e resolvi parar porque não via nada e quando saí para a chuva era um precipício porque tinha saído da estrada e se o carro tivesse andado mais meio metro a Francisca.

Baleal.

Mas esta noite Sábado foi noite de andar tranquilo, noite maior. Porque é que acham as pessoas que é preciso ver para conhecer, ver para escutar? Eu conheço tantas coisas que não vi, de mim que vejo todo o dia (carro negro) não sei dizer coisa que valha. Por isso não foi noite de te conhecer, só de sorrir às coisas que ias dizendo, às mantas em que te embrulhaste, às voltas que davas na capa enrolada (três voltas para a esquerda, três voltas para a direita, sabes que as bruxas às vezes fazem assim?), tantas coisas. Tanto vento, não foi?

Tanto vento frio sim, e a lua (reparaste) que parecia como dizias um rasgão no céu quase negro quase baixo, um rasgão feito para passar a luz feito para passar um sorriso envergonhado. Eu vi uma estrela cadente e até disse baixinho olha peçam um desejo mas tu falavas de brincar e tu acendias um cigarro negro e não devem ter ouvido, mas eu pedi que os pedidos todos fossem que sim. E pensei que éramos a rosa-dos-ventos (rosas bravas) e qual de nós era o Norte, eu o Leste dizem sempre que eu ando a Leste e sim, eu sabia que os morcegos não são insectos estava a brincar.

O tempo afinal tem marés baixas, a certa altura quase parado, como se a noite quisesse ser igual a mim. É bom viver. Agora mesmo recebi um mail, e as palavras de Borges "a mis años, toda empresa es una aventura que linda con la noche". É assim, pois é. Na minha idade as coisas todas são aventuras. Um dia hei-de crescer. E vocês, rosa-dos-ventos, sejam.

14.9.04

1. Perguntaram uma vez, na Televisão, a um padre católico que eu conheço se não achava que a Igreja (quem perguntou queria dizer "os padres") era "pouco espiritual". "Nada espiritual", respondeu ele - e sim, ele gosta de provocar - "Isto é carne mesmo. Carne. Pessoas. A Igreja é feita de pessoas vivas."

2. O C. S. Lewis, que era um escritor irlandês protestante, escreveu uma vez um livrinho em que imagina os conselhos que um diabo velho e sabido dava a um diabrete seu sobrinho, jovem e inexperiente, que se iniciava na difícil tarefa de nos atazanar a vida. O diabrete julgava que uma das coisas mais importantes era convencer as almas a não frequentar as igrejas. "Que disparate", escreve-lhe o tio, "As pessoas que não vão às Igrejas são muitas vezes boas, o que é mau. Deves convencê-las a ir. E quando lá chegarem, a olhar para o lado em vez de pensar naquele cujo nome não dizemos. E olhando para o lado vão pensar 'eu sou tão diferente deste imbecil, olha que ridículo que é esta com a saia torta e os dentes de cavalo...', e vão tr vontade de rir. E aí sim, tornam-se más, o que é bom".

3. E esta é uma historinha americana de há muitos anos, que li numa revista. Falava o mais novo de nove ou dez irmãos: "A diferença", dizia ele, "é que quando o meu irmão mais velho engoliu pela primeira vez uma moeda, os pais levaram-no ao hospital e a mãe chorou toda a noite. Quando EU engoli uma moeda, os pais descontaram-me na mesada:"

E agora deixa-me contar o fio da meada. Acho que vivemos num mundo afogado em falsa perfeição. A perfeição que supostamente a juventude tem, ou podia ter. A perfeição dos corpos felizes. A perfeição das almas lavadas. A perfeição solar do meio-dia, hora de praia. Depois sabemos que as coisas não são assim, e dizemos uns aos outros "eu amo-te" e "tu tens de ser muito, mas muito feliz". As capas das revistas falam dos "casamentos perfeitos", e afinal lá dentro falam do vestido da noiva. "Casamento perfeito" é o nome de um livro que foi escrito há quatrocentos anos, em Portugal, e que andei a reler estes dias. É um livro a alertar contra a "paixão", e a explicar que as relações são melhores quando são mais impessoais. E isto parece-nos hoje tão estranho. Mas eu penso que a felicidade não se "procura". Um dia olhamos para trás e, se a nossa vida tiver sido boa, descobrimos que "temos sido" felizes. A felicidade é o balanço das coisas que fazemos (fizemos), não um "momento".

E como fazer para que o balanço seja bom? "I can't carry IT for you, Mr. Frodo", diz Sam Gangee, e pelo menos se leste ou viste o Senhor dos Anéis podes entender. "But I can carry YOU".

Toda a minha vida pensei assim. Toda a minha vida, ou grande parte dela, fingi que não sabia disto. O diabrete sobrinho não teve grande trabalho comigo, tantas vezes.


8.9.04

As coisas que eu sou (I): Os despojos do dia


Não sei porque é que me deu hoje para falar disto, nem se saberei falar, com vagar e com nitidez, das coisas que eu sou, das coisas que me fizeram - livros, filmes, talvez algumas paisagens e algumas casas e talvez também algumas pessoas que na minha vida passaram como um filme, uma paisagem ou talvez, temporariamente, uma casa. Deve ser por ser Setembro, por a luz andar cada dia a entristecer.

E de entristecer é a história com que começo, o fabuloso filme (ainda não li o livro que tenho na minha prateleira, e talvez tenha medo de me desiludir, ou de entristecer mais) de Anthony Hopkins e de Emma Thomson, de toda uma Europa e de toda uma casa que foi feita para durar, como para durar foi feito este nosso mundo. Tão frágil. Tão frágil Emma Thomson, tão frágeis as mãos. Mas é melhor contar as coisas desde o princípio. Vamos ver se me lembro, porque vi este filme demasiadas vezes para reter pormenores, cada vez mais só vão ficando os olhos e as mãos e o silêncio e as coisas quebradas, só vai ficando o que afinal importa.

Há uma casa grande, talvez no Norte de Inglaterra, uma daquelas casas inglesas que nos ensinam que não há tantas diferenças assim entre um castelo e um palácio, rodeada por um lago e por árvores grandes que devem esconder pássaros e ribeiros e amoras silvestres e que é habitada por um lorde simpático, grisalho, solteirão, cheio de boas intenções e cheio de falta de senso. Há um batalhão de criados chefiados por um mordomo que sempre lá esteve, Mr. Stevens (Anthony Hopkins) e por uma governanta recém-chegada (Emma Thomson). Há Mr. Stevens Senior, o antigo mordomo reformado e pai do actual (e pai e filho tratam-se por "Mr. Stevens" e já vou explicar porquê). Há um sobrinho do Lorde que creio ser um inacreditavelmente jovem Hugh Grant. Há a casa, e a casa é o principal personagem. A casa, o mundo, as pessoas: os despojos do dia.

O lorde lá em cima, entre as tapeçarias e as lareiras acesas, planeia a aliança e a paz com a Alemanha de Hitler em que tantos ingleses acreditaram antes dos anos da guerra. Para ele há todo um mundo a preservar, um mundo tranquilo como tranquila era aquela casa ao fim da tarde e de que ele acredita ser o servidor fiel. Mr. Stevens, lá em baixo, reproduz com meticulosidade a ordem que reina (porque ele a faz reinar) em todo o lado. Ele sabe o sítio das coisas, o lugar dos homens, o tempo de fazer com que as coisas nasçam. O lorde vai ter convidados de toda a Europa, diplomatas e políticos vão tratar grandes coisas, como a paz e a guerra. Haverá franceses e alemães, aristocratas e raposas. O lume tem de estar aceso, o chá tem de estar pronto, no jantar não pode faltar uma atenção, um esmero, um cuidado. Hoje a Casa vai ser a Inglaterra, e a Inglaterra vai ser o Império.

E por isso a vida de Mr. Stevens cruza a vida da governanta sem ter tempo para a palavra que talvez mudasse tudo. Hoje não tenho tempo, minha senhora. Hoje estou muito fatigado, e amanhã tenho que acordar com o nascer do sol. Eu não sou eu, n?o sou o homem que quer encontrar atrás dos meus olhos baços. Sou Mr. Stevens, que ocupa o lugar que foi de Mr. Stevens Senior, e as coisas têm de estar feitas, alguém tem de as fazer. Lá em cima Sua Senhoria desenha os Impérios e por isso eu tenho que desenhar o lugar à mesa dos Eleitos. Vá trabalhar também, minha senhora tão linda e tão desastrada, as flores e as taças delicadas precisam de si como de mim precisa o batalhão de criados e ainda agora Sua Graça chamou, talvez alguém queira mais chá. Have a good night, Ms. Thomson.

Há uma cena fabulosa em que, na mesa dos criados em que o jantar tem mais regras e mais cerimonial do que a maior parte de nós alguma vez viveu, um dos mais novos (um dos do fundo da mesa) diz "quando for grande hei-de ser mordomo", com os olhos brilhantes como se anunciasse uma cruzada ou um amor de Outono. E Mr. Stevens Senior, na sua voz arrastada que nos arrasta para dentro das coisas começa devagar a contar uma história, "there was this butler in India...". Na casa de Lorde X, quando entrou um tigre na sala enquanto os convidados jantavam. E o mordomo apenas perturba a paz dos Grandes do mundo para dizer ao ouvido do seu senhor "havia um tigre na sala, Sir. Procurámos não sujar o tapete.". E nós vemos Mr. Stevens franzir o sobrolho, porque a gargalhada de Mr. Stevens Senior foi um pouco alta demais, indeed...

E depois, talvez dez ou quinze anos depois (depois da partida da governanta, depois da guerra que afinal o Lorde não evitou, depois da morte de Mr. Stevens Senior, depois da queda de tantas coisas representadas por um tabuleiro de ch? que se derrama no jardim), Hopkins e Thomson reencontram-se numa tarde marítima (o mar em que as coisas nunca poderiam ser assim ordenadas, assim quietas), sabendo que essa tarde já nasceu tarde demais. Já não me lembro se falaram daquilo que entre eles sempre andara calado. Se um ao outro disse as palavras que melhor do que ninguém murmurou a Nastassja Kinski no "Revolution" quando também deixou passar para sempre aquele que podia ter ficado, "we could have talked...". Já não me lembro do olhar dela que trago trago inteiro no fundo de mim.

A casa grande das lareiras e dos livros encadernados (ah, a biblioteca de Lorde Darlington...) é, claro, a imagem do mundo, e a imagem de cada um de nós. E esta não é (a não ser que já levemos lá para dentro os olhos enganados) uma história de injustiça social e um apelo à criação do novo mundo. É talvez, juntamente com o "Leopardo" de Visconti (outro filme que é uma coisa que me fez, e de que falarei um destes dias), o melhor retrato da impossível fragilidade da beleza. É uma coisa que demora duas horas a passar à nossa frente e que afinal é o último raio de sol por entre as árvores tão grandes. Sim, os despojos do dia. Quanto em mim é esse Lorde Darlington toleirão e simpático, que acredita que as coisas simplesmente estão ali para que ele as desfrute, quanto de mim é esse Mr. Stevens que não nasceu para se sentar (a certa altura o Lorde diz-lhe "Tens trabalhado muito, Stevens, e tens trabalhado bem. Have a cup of tea.". Obrigado, Milorde, mas tenho ainda algumas coisas para fazer hoje, yes. If you excuse me, Sir.)

A Casa não viveria só com o andar nobre, e não teria sentido só com a cozinha e a copa. Só é pena que a Thomson não tenha ficado, só é pena que as coisas sejam assim. Que eu seja essas coisas, e mesmo assim seja tão pouco. Mas o que dava vida a todo aquele mundo não eram os olhos altivos do Lorde Dralingtom, não eram os olhos sonhadores (os olhos sonhados) da Thomson. Era o olhar baço de Mr. Stevens. Era o olhar dele que fazia o fogo arder, os cobres luzir, os olhos da governanta saber que podem ser outra coisa além da governanta. A catedral assenta inteira na pedra humilde junto ao chão. Em que assentam afinal os nossos voos mais altos?

There was this butler in India... E não, não vou chorar alto de mais.





6.9.04

Sobre Comentários neste blog, férias e outros temas escaldantes

Há umas semanas atrás, todos os comentários que mne deixaram anteriores a, creio eu, Maio, deixaram de estar indicados (isto é, no fim do post aparece um "zero comments" embora cada um dos comentários lá continue).

Agora acontece o mesmo relativamente aos comentários de hoje.

Entretanto (obrigado, Gotika), existe uma segunda "caixa" de comentários (será assim que se diz?), paralela à primeira, disponível para todos.

Enfim, coisas da vida.

Nos próximos quinze dias, é possível que passe cá menos vezes e, passando, tenha menos tempo para escrever. Vou descansar, dormir, talvez viajar um pouco (entre expressos e regionais, como dizia atrás a Evil Angel).

Talvez devesse dizer que depois haverá profundas transformações que certamente irão ao encontro dos desejos dos leitores e que farão da nossa ribeira um espaço verdadeiramente moderno com mais diálogo e alegria. Mas não. Ainda não será desta.

E pensando bem, I'll be around, watching you carefully.

Sonho

Tive um sonho esta noite, mas prefiro dizer como diziam os antigos, esta noite adormeci e fui em sonhos a um sítio...

Estava num carro com uma rapariga que devia ser (tinha de ser) uma namorada. Não me via a mim e não a via a ela. Nunca lhe vi a cara (era ela que conduzia). Mas não era ninguém que exista ou tenha existido. E por isso era ela, mesmo. Éramos, acho, muito novos os dois, tão novos que me lembro de pensar que era estranho ela já ter carta, e sentir alguma coisa dizer-me que não fizesse perguntas dessas. Porque aquela não era uma tarde de falar, mas uma tarde de coisas inteiras, de coisas finalmente intactas. Estava num carro com uma rapariga sem cara (era ela que conduzia, que me conduzia, era ela a tarde) e se conseguisse não acordar ia ter a história até ao fim.

Andámos em silêncio, depressa porque depressa ela andava sempre, fazia tudo, depressa mais depressa vem. E eu esperava que ela dissesse as palavras do fim. Talvez tivesse os olhos baixos, e por isso via tão bem as calças que ela trazia, negras como era negra a manga de uma camisola no braço firme, a mão parada na caixa das mudanças. Talvez por isso via tão bem a porta do carro - era cinzenta. Não me via a mim. E à minha frente havia uma espécie de teclado estranho, espalhado nas paredes do carro, e com ele escrevi letras que se desenharam no vidro embaciado pela chuva que caía à minha frente. ELA NÃO VAI DIZER NADA.

- Vamos falar, disse ela ao meu lado, e a voz vinha de tão longe, perto de mim.

- Sim, respondi, e como sempre acontece o meu coração seguiu sozinho o resto da história, desinteresando-me do que estava à volta. Sim, vamos falar. Ou melhor, tu vais falar e eu vou ouvir como sempre faço. Vais dizer que está tudo bem e que gostas de mim, sempre gostaste. Mas eu não vou saber para quem olhaste ainda agora na escola antes de entrar no teu carro cinzento, a quem disseste até já eu não demoro.

É pena as montanhas serem de carvão.

Subiste um passeio muito depressa, acho que para parar o carro e finalmente ia ter de te olhar. E o carro começou a derrapar. A tua mão já não está quieta, vejo bem os dois braços a tentar segurar o volante e o carro começou uma dança lenta, lenta imparável e rodamos com as montanhas e a chuva uma dança cinzenta que quer fazer a história acabar assim (tu sempre conduziste tão depressa, sempre fizeste tudo tão bem). O céu está tão baixo à nossa volta, e as letras ELA NÃO VAI DIZER NADA brilham no nevoeiro de fora e eu sei que há um abismo ao lado da estrada e que o carro vai cair. Morrer não é um mau princípio para esta história, pensei. Já a vi até ao fim, e agora sei como vai acabar.

Havia uma música, e só a reconheci quando acordei.

Pain in places where the lovers mourn
Arranging the play things up and down the hall

Forever remain for every day
My honour remains
Forever remain...

E eu soube que os cabelos eram negros como tudo o resto, soube embora continuasse só a ver a porta do carro e as letras douradas e as montanhas do nevoeiro lá fora. O carro continuava a sua dança estranha, e depois parou ao mesmo tempo que a música se calava e as letras agora marcavam no vidro uns versos impossivelmente perfeitos.

- Não vai acabar, disse ela, eu não li o que escreveste no vidro e por isso não vai acabar. Por isso não caímos. Tu percebes tudo ao contrário, eu não disse a ninguém até já e esta era para ser uma história de ficar.

E lá fora era agora a estrada, alcatrão e uma curva longe e talvez uma placa a dizer Viseu ou Vila Real, não me lembro. E ela falava, e era preciso apagar as palavras marcadas no vidro, no nevoeiro. Ou que eu visse o rosto dela, e continuava a não levantar os olhos (a porta do carro cinzenta, cada pormenor do fecho, do estofo, dos botões à minha frente). Last exit for the lost.


5.9.04

Viajar

Por várias razões, de que a principal é - claro - a falta de dinheiro, foram muito poucas as viagens que fiz na vida. Já estive em Paris e em Londres, e é tudo (não compreeendo as pessoas que dizem, nestas circunstâncias "conheço Paris e Londres": nem o Porto onde nasci eu me atrevo a dizer que conheço). Mas gostava de viajar. Gostava muito.
Não tenho alma de nómada, e tenho muita pena. Gostava de poder andar sem sentir o lugar de onde vim como o Norte de bússola nenhuma. Gostava de saber que me era indiferente estar na Argentina ou em Madrid ou na Sibéria do Sul (haverá uma Sibéria do Sul?). Mas não. Tenho uma casa dentro de mim. (a casa não é o Porto; é o Alto-Minho e a Galiza, o único sítio - juntamente com Lisboa - onde respiro como respiram as crianças; todos os outros sítios são mais ou menos bonitos mas são antes de mais sítios de olhar).
Gostava de conhecer Budapeste, Praga, Edimburgo, Copenhague. Gostava de subir a Noruega a caminho do frio, e assistir à morte do sol nos fiordes que imagino negros. Gostava de parar em Olímpia e em Capri. Gostava de ver o milagre de Veneza deserta. Gostava de encontrar na Rússia uma mulher que me fizesse lembrar a Rússia. Gostava de ver o silêncio pesado de Colónia.
Fora da Europa, só o mundo do mundo me interessa, não o mundo dos homens. Mais do que tudo, queria ver o Estreito de Magalhães.
Talvez um dia.

4.9.04

Notas pequenas

Nunca confies num homem que não tenha inimigos.

Nunca confies num homem que te diga que não seria capaz de matar ninguém (não é porque ele afinal te queira matar; é porque não seria capaz de coisa nenhuma que valha a pena).

Nunca confies num homem que nunca andou à chuva.

Nunca confies num homem contente.

Nunca queiras ensinar o porco a dançar: perdes tempo e aborreces o porco. (esta é do Robert. Heinlein)



1.9.04

Setembro e outras coisas

Finalmente. O meu mês preferido (bem, juntamente com Outubro e Março...). Eu ando realmente ao contrário. Chega Setembro, e a Primavera desperta dentro de mim.

agora, um excerto da "Suite Lawrence Talbot", de Simon Moon:

"O meu coração louco e lobisomem
desperdiçou quarenta e dois anos a uivar
esperando e desesperando [...]

A minha alma branca e púrpura
desperdiçou quarenta e dois anos a cantar
gozando e troçando [...]

O meu cérebro frio e febril
desperdiçou quarenta e dois anos a rir
medindo os factos [...]

Até que o desafio erigiu [...] uma verdade menos dócil
do que a verdade da morte:
[...]
Eu sou a Besta que a Dama cavalga
Eu sou as estrelas no interior do seu cabelo"

Setembro. O mundo a aquietar-se marca o tempo de eu dançar.